Funasp | Dinheiro privado cria unidades “de elite”


Dinheiro privado cria unidades “de elite”

Dinheiro privado cria unidades “de elite”

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O financiamento de atividades da Universidade de São Paulo por fundações criou categorias diferentes de unidades, conforme o grau de facilidade em captar recursos junto à iniciativa privada.

Quem conhece algumas salas da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) e entra no prédio da FEA (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) tem a impressão de que as duas unidades pertencem a diferentes universidades.

Na filosofia, os bancos das salas de aula são de madeira, os móveis são antigos e os quadros negros têm posição de destaque. Na economia, as salas têm cadeiras estofadas, há retroprojetores, móveis novos, um sistema central de ar-condicionado que custou R$ 1 milhão e não faltam computadores.

A diferença é que a FFLCH (conhecida como “fefeleche”) se mantém basicamente com as verbas da USP, enquanto a FEA recebe dinheiro de três das fundações que mais arrecadam recursos externos: FIA (Fundação Instituto de Administração), Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) e Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras).

Em 2003, as 33 fundações ligadas à USP faturaram cerca de R$ 200 milhões e repassaram à universidade R$ 5,8 milhões, 2,9% do total. Se forem considerados os recursos do SUS (Sistema Único de Saúde) repassado pelo governo federal às fundações da Faculdade de Medicina, que administram o Hospital das Clínicas e o Incor, o volume sobe a R$ 700 milhões.

As fundações são consideradas órgãos de apoio à USP e foram criadas com o objetivo de gerir relações com o mundo exterior que a universidade não teria agilidade e flexibilidade para absorver.

Se uma empresa quer contratar um professor da USP para dar um parecer, por exemplo, ela pode fazer isso diretamente ou por meio de uma fundação, se o profissional preferir. Nesse último caso, parte do que ele ganhar ficará com a fundação, que, por sua vez, pagará uma taxa à universidade.

Os professores podem ainda desenvolver nas fundações projetos de pesquisa financiados por empresas ou outros órgãos públicos.

Entre as 33 fundações, há uma que faz exclusivamente isso, a Fusp (Fundação Universidade de São Paulo), que transferiu à USP R$ 1,8 milhão em 2003.

Os críticos dizem que algumas das fundações deixaram seu papel de interface com o mundo exterior e se transformaram em verdadeiros negócios. Os principais alvos são as instituições ligadas à FEA, que obtêm o maior volume de recursos. Além dos MBAs, as três entidades dão consultoria, desenvolvem produtos e têm projetos em parceria com empresas.

A Fipecafi, por exemplo, é responsável desde 1995 pela elaboração da “Melhores e Maiores”, da revista “Exame”, em um projeto coordenado pelos professores Nelson Carvalho e Ariovaldo dos Santos, presidente da fundação.

No prédio do departamento de contabilidade, há uma sala com a placa “Projeto Melhores e Maiores”, no qual trabalham profissionais contratados pela Fipecafi.
Santos afirma que a relação comercial da fundação com a editora Abril, responsável pela revista, traz benefícios acadêmicos, entre os quais está o acesso ao banco de dados com informações contábeis das 500 empresas analisadas na publicação. Segundo ele, 142 trabalhos foram realizados com base nesse banco de dados, entre os quais 22 teses e dissertações.

Os integrantes das fundações argumentam ainda que as entidades aproximam a universidade da sociedade e das empresas. Acima de tudo, as fundações permitem a complementação de renda do professor e mantêm na universidade profissionais que, de outra forma, já a teriam deixado.

Entre os programas da FIA está o Provar, que realiza uma das principais análises de varejo e consumo do país. O projeto tem financiamento de 11 empresas, entre as quais está a Folha.

As fundações também concedem bolsas para estudantes de mestrado, financiam publicações e bancam viagens de alunos e professores para participação em congressos. Seus críticos afirmam que tudo poderia ser feito diretamente por meio da universidade, enquanto os defensores respondem que a centralização desperdiçaria os recursos nos meandros da burocracia estatal.
No ano passado, foi constituído um grupo de 40 pessoas para elaborar uma proposta de regulamentação dessas entidades. O resultado não agradou a nenhum dos lados e a solução final deverá ser dada pelo Conselho Universitário, órgão máximo da instituição, até a metade do ano.

O professor Luiz Nunes, pró-reitor de pesquisa, diz que houve consenso no grupo de estudos sobre dois pontos: faltam informações sobre as fundações e é necessário criar um sistema de controle sobre seu funcionamento.